Por Raphael
Oliveira - Falar de Rock vitoriense e não falar da Obscurity Tears é um
sacrilégio. Por isso, nada melhor do que chamar um dos caras que participou
ativamente da cena musical vitoriense, quando muitos leitores desses blog nem
eram nascidos. Falo do meu amigo Evandro, guitarrista da Obscurity Tears, fiz
esta entrevista exclusiva com esse, porque não, ícone do Rock vitoriense para
que os mais novos entendam um pouco da ralação da galera que começou a tocar
música de qualidade aqui em Vitória de Santo Antão. Agora lhes convido para
voltar no tempo nessa entrevista recheada de fotos do arquivo pessoal do Evandro. Não estranhem as vastas cabeleiras nas fotos mórbidas e obscuras dos caras que hoje são pais de famílias e se lembram de toda aquela época com muito carinho.
Enjoy!
OsomNaCidade
- Como sabemos, você é guitarrista, como foi seu
interesse pela guitarra? Lembra-se do primeiro instrumento?
Evandro - Primeiramente parabéns pela
iniciativa e obrigado pelo espaço. Bem, comecei a tocar guitarra com 16 anos,
escutava bandas como Guns N´Roses, Nirvana, Metallica, Legião Urbana, etc.
Bandas que tinha acesso na época. Aprendi a tocar praticamente sozinho, tudo na
raça mesmo. Meu primeiro instrumento foi uma Giannini Stratosonic tosca e
surrada que fiz uma troca em uma bicicleta com meu amigo Luciano Miranda
(ex-baixista e tecladista da Obscurity Tears) onde levei um super “fumo” na
troca (rsrss).
Depois disso comecei a querer entender o instrumento e a
primeira frustração foi saber que o som da guitarra pura não tinha aquele timbre
pesado das bandas que ouvia, ou seja, eu precisava de algum equipamento para
drives e distorções. Naquela época, 1995/96 o acesso a equipamentos era bem
diferente de hoje em dia, pra comprar um jogo de cordas, uma palheta, só indo a
Recife. Com o tempo fui me entrosando e conhecendo músicos da mesma época que
eu e trocando informações, dicas e tal. Lembro-me que comprei um pedal de
distorção que na época era o clássico pra heavy metal e afins, o famoso Boss
Metal Zone, e os guitarristas da época (Wellington, Eduardo, Flávio Valério,
Augusto, dentre outros.) foram até minha
casa pra “sacar” o som do pedal, era uma época muito legal. Com o tempo
comecei a tentar montar banda e tal... Eu
e Wellington (ex-guitarrista e vocalista da Obscurity) tentamos montar uma
banda, e com isso aprendemos juntos realmente a criar riffs, solos e arranjos. Nessa
época o Death Metal era a palavra da vez.
OsomNaCidade
- Como foi a formação da banda Obscutiry Tears, como conheceu os membros da
formação original e como foi a ideia de montar a banda?
Evandro - O Obscurity Tears na verdade
surgiu da evolução de duas bandas: a Scum que era uma banda de Death Metal, que
contava com Denes Santos na bateria, Júnior Vidrozito no baixo, Flávio Marcelo
na guitarra, Flávio Valério também na guitarra e Wíres Alves nos vocais. Com
toda certeza a primeira banda de Metal de nossa cidade. Scum chegou a tocar na
segunda edição do Blizzard of Rock em meados de 1993/94. O famoso “show da
toca“ , onde aconteceram coisas bizarras, dentre elas um acidente com o ônibus
que veio trazer as bandas e público de Recife (se não me engano o ônibus ao
retornar a capital pernambucana, atropelou um motoqueiro...). A outra banda, que na verdade foi a sequencia
da Scum foi a Smashed Face, que foi na verdade o que criou os moldes do que
seria a Obscurity Tears.
Nessa época, a banda mesclava Death Metal com partes e
climas Doom. Conheci o pessoal na loja Mascate Som, do nosso amigo Cristóvão,
comecei a frequentar alguns ensaios e shows, algum tempo depois veio o convite
e até hoje aqui estou.
OsomNaCidade
- Naquela época era uma ousadia uma banda do interior que tocava Metal pensar
em lançar um Disco, como foi a experiência?
Evandro - Bem, entrei na banda em meados
de 1997/98. A banda já tinha um pouco mais de experiência em palco e repertório
já definido, com isso muitos shows pintavam no circuito underground da época.
Em 1999 decidimos nos preparar para gravar nosso primeiro CD, nessa época tínhamos
um estúdio próprio (o único da cidade) para realização dos nossos ensaios (e
bebedeiras). Nessa época, conhecemos Nitelma Lima, que começou a frequentar os
ensaios da banda. Certo dia ela resolve “brincar” e cantou um trecho de uma
música lá qualquer... Lembro-me que todos ficaram observando...
Dias depois comentamos a hipótese dela cantar
apenas trechos das nossas músicas, no estilo backing vocal. A coisa deu certo
ao ponto de determinarmos ela como vocalista da banda. Com isso, a Obscurity além de ser a primeira banda de Doom Metal de
Pernambuco, foi pioneira também nessa
mescla de metal extremo + vocais femininos no nordeste. Meses depois, após
adaptarmos algumas músicas e criar outras especificamente para a voz da
Nitelma, resolvemos agendar as datas de estúdio. Na época, ninguém tinha carro
e resolvemos pedir apoio à prefeitura para um transporte a capital
pernambucana. Era um micro-ônibus velho caindo aos pedaços que nos levou
durante 4 semanas ao estúdio de Delbert (amigo indicado por Apolo Natureza) onde lá, fizemos as gravações
do que seria o Songs For a Black Winter.
Gravação finalizada ficou tudo
lindo? Não... a gente queria um cd pesado de verdade!
O resultado não atingiu
nossas expectativas, decidimos fazer uma remixagem, fomos a outro estúdio e
mesmo assim, ao ouvir o CD em casa a sensação era de que “faltava peso” e com
isso outra mixagem num estúdio muito famoso na época o DB3 que foi indicado por
Aninha, esposa de Washington (The Ax). Lá finalmente conseguimos chegar nos
timbres que queríamos, e com isso fomos pra casa com a matriz remixada e
estourando os auto-falantes por ai a fora de tanto grave e pedal duplo. Todos
felizes com isso rsrsrs
OsomNaCidade
- Como foi a aceitação do material da banda aqui na região e no mundo, sabemos
que vocês alcançaram um ótimo público além do público brasileiro.
Evandro - Em Vitória na época agente
sendo do “Lado Negro da Força”, as bandas e públicos locais não apoiavam nem
admiravam muito, mas isso nunca nos incomodou...
Éramos um time forte, unido,
com causa e metas determinadas. Voltando
ao CD, após finalizar a mixagem, só tínhamos a matriz do CD e em poucas semanas
era o 4 Blizzard of Rock, onde decidimos lançar o disco. Mas como, se só
tínhamos a matriz? Foi agonia!!! Eu e Jefferson (violinista na época)
conseguimos fazer 20 cópias com um drive de CD rabugento e imprimir de última
hora um encarte improvisado, poucos minutos do show começar e eu e Jefferson
ainda estávamos colocando os encartes nas caixinhas dos CDs... com isso o CD
foi lançado nessa edição do Blizzard, vendemos as 20 cópias e essa versão,
essas 20 cópias se tornaram raridade total, quem tiver que guarde! Meses depois, começamos a fazer cotações de
empresas para fabricar o CD, queríamos o CD em mãos o mais breve e nada de
cópias vagabundas. Lembro-me que fizemos um empréstimo com o pai de Flávio para bancar a prensagem e logo em seguida ir pagando com as vendas do disco. Após tudo resolvido, lembro-me da ligação de Flávio “Evandro, os CDs chegaram vem aqui ver...” chagando lá, estavam no quarto de Flávio as inúmeras caixas da emprsa CD+ com todos os CDS lacradinhos e com aquele cheirinho de novo. Foi orgasmático! Desse dia em diante começamos a divulgar o Songs For a Black Winter, mandando pra zines, revistas, sites...
Na Rock Brigade tivemos nota 9.0 e fomos comparados com o Tirstania (banda de Doom Gothic muito famosa na época). Na Rodie Crew saiu a nota que citava a seguinte frase:
“Como uma
banda vinda lá de Vitória de Santo Antão, interior de Pernambuco conseguiu
compor um material tão denso e que poderia figuar lado a lado com os medalhões
do estilo” – Ricardo Batalha, redação da Rodie Crew.
Com esse feedback, você pode
imaginar como era nossa empolgação né Brother? E com isso, vieram muitos shows,
muitos shows mesmo, pra uma banda underground agente tocava muito, cerca de 2
shows por mês em diversas cidades e até alguns estados do nordeste.
O CD também
foi distribuído pra outros países, algumas gravadoras compravam o disco conosco
e distribuíam mundo afora. Até hoje tem site gringo vendendo o Songs For A Black
Winter, só pesquisar.
Em 2009, após diversas mudanças de
formação e uma pequena parada, gravamos o EP My Chemical State, disco com uma produção
bem melhor que o Songs, com uma gravação pesada e ao mesmo tempo cristalina, um
disco mais direto e que estreava a Márcia Raquel nos vocais. O disco que também
foi muito bem aceito e serviu para conseguir muitos shows no já saturado
cenário metal de PE. Apesar de bem aceito, o My Chemical State foi lançado na
era do MP3, com isso as vendas não foram boas e decidimos soltar o disco na
internet pra todos baixarem, queríamos mesmo era tocar ao vivo, que sempre foi
nosso ponto forte.
OsomNaCidade
- Nos revele um show memorável da Obscurity.
Evandro - Bem, foram muitos shows em
diversas épocas, diversas situações e lugares. Tocamos em locais com estrutura
top de linha, mas também em muitos “buracos”.
Posso destacar alguns como o
Killing of Carnival Creation no Recife Antigo, onde tocamos com uma das
melhores bandas de metal do país, o Malefactor, que inclusive fizemos uma coisa
inusitada, tocamos um cover do Jethro Tull com a participação de Lord Vlad nos
vocais. Também destaco o show do By Area Festival, onde lotamos a o Docas (antigo
clube que abrigava os shows de metal em Recife) e acreditem, todos tavam lá pra
ver o Obscurity Tears. Era impressionante o feedback, a aceitação das músicas
perante o público era perfeita.
OsomNaCidade
- Como era ser músico em Vitória de Santo Antão
naquela época, a organização de eventos, onde o pessoal se reunia para ouvir e
fazer música.
Evandro - Ser músico no Brasil e ainda
mais no interior não é tarefa fácil, se tratando de metal então...
Show basicamente só rolava o Blizzard, além disso, outros “curiosos” que organizavam alguns eventos muito mau feitos e sem estrutura decente, que inclusive, faziam questão de nos deixar de fora, nos tachavam de “estrelas”, a Obscurity despertava ódio, inveja e tudo que não presta nessas pessoas de pensamento pequeno que infectavam o cenário musical de Vitória na época, isso tudo era um alimento recheado de vitaminas pra nós. Sobre locais, tinham poucos ou quase nenhum lugar pra tomar uns drinks e escutar rock/metal. Geralmente as “festinhas” eram mesmo no nosso estúdio o “Black Winter Studio”.
OsomNaCidade
- Ainda tem algum material perdido, esquecido ainda não lançado da Obscurity?
Evandro - Sim, temos material de shows
antigos, vídeos restaurados de VHS e algumas músicas de uma pré-produção que
foi feita em 2006. Todo esse material está arquivado, e penso em soltar algumas
coisas pra o pessoal conhecer as diversas fases da banda.
OsomNaCidade
- Sabemos a Obscurity Tears está parada, você tem alguma ideia pra voltar a
cena musical da cidade, seja o retorno da OT ou algum outro projeto?
Evandro - A Obscurity está parada por
tempo indeterminado, não temos planos agora de fazer nada quanto a isso, pois,
todos estão muito atarefados com seus trabalhos, família e tal... rolou
recentemente um papo de fazer um show comemorativo de 20 anos no Blizzard 2014,
mas isso tudo ficou apenas entre espumas na mesa do bar rsrs. Sobre projetos, recentemente eu, Júnior e
Jefferson em plena Copa do Mundo, decidimos “fazer um som” e saiu umas coisas
interessantes, nada definido, mas acredito que poderemos fazer um material
legal em breve.
OsomNaCidade
- Como você enxerga a cena musical atual da
cidade?
Evandro - Confesso
que estou afastado de tudo isso a certo tempo, mas algumas pessoas tem minha
admiração pelo seu trabalho e afinco, posso citar o trabalho do amigo Barreto,
do Gabriel Oleron e da Sexto Ato, que vem mantendo suas bandas/projetos sempre
em alta. Gosto de ver pessoas determinadas correndo atrás de seus objetivos, esse
blog é um bom exemplo disso, um espaço pra reunir as ideias, contar histórias e
debater sobre música, cultura, arte...etc.
É isso pessoal!! Nessa entrevista você conheceu um pouco mais dos primórdios do Rock vitoriense, conhecer personagens e histórias bacanas, mas este post sobre a Obscurity Tears não vai acabar aqui, como o próprio Evandro nos falou, existem materiais inéditos que nunca foram lançados e que com certeza em breve vão pintar por aqui!! Nos aguarde!
Muito boa a entrevista, a Obscurity foi a primeira banda autoral de Vitória a ralar pra ter um material próprio de qualidade e a fazer shows fora de Vitória, a galera mais nova que tem banda deve se espelhar neles e conhecer o trabalho independente da tribo musical.
ResponderExcluirMuito boa matéria, isso serve de exemplo para bandas, "(eu)", que começam agora, principalmente nessa área do rock!
ResponderExcluirVlw :)